A Gaivota Farragulha

    quinta-feira, fevereiro 26, 2009

    O Caozinho Feio

    Lembro-me de pensar que o Cao de Água Português era sinceramente feio. Logo à primeira vista, o animal tinha uma embaracosa parecenca com o Caniche, Poodle ou ainda Rei dos Caes Tenebrosamente Horríveis Adquiridos por Pessoas de Gosto Dúvidoso com Ambicoes Sociais Optimistas - agora destronado pelo Chihuhuahua (a ideia deixou de ser: 'a minha casa é tao linda que ate tem uma sanita de mármore com um belíssimo assento de pelúcia', para ser: 'estar acompanhado de um animal tao feio, faz-me parecer bonito(a)'. Antes fosse que esse tipo de projeccoes influenciasse a forma as mulheres escolhem um homem do que um cao... mas enfim, representacoes do animal enquanto extensao capilar das próprias donas prejudicou fatalmente a minha opiniao sobre o dito bicho. Mais a mais, essa semelhanca física nao era suficientemente próxima para revelar algum digno grau de parentesco entre as duas racas, de modo que o Cao de Água Português se apresentava quase sempre como a versao rasca do segundo, como o primo mal-vestido e mal-educado, filho DAQUELA tia que se infiltrou na família, e que geralmente fica sentado a um canto nos casamentos. Acima de tudo, o Cao de Água Português sofria dessa grande mal que era ser Português, facto que, para pior dos males, nao podia esconder visto constar do seu próprio nome, e que o tornava indesejável aos olhos de muitas boas e nobres famílias.
    Porém, tudo isso mudou esta manha quando foi finalmente revelado que o First Dog escolhido por 'Sasha e Malia' era nada mais, nada menos, do que Cao de Água Português. Aos poucos, enquanto lia as descricoes do bichinho no site BBC News, no New York Times e no El País (a notícia foi dada pela Primeira Dama numa entrevista à revista People e saí hoje na capa), comecei a descubrir a sua beleza salgada. Aparentemente, o animal tem um espírito determinado, é corajoso e incansável e até Ted Kennedy, o último bastiao dessa dinastia de bom gosto e rectidao moral, tem dois. Bem, no final disto tudo, já achava o cao um animal brilhante e, devo confessar, queria um também. Nao o preto, mas um de cor diferente, talvez houvesse já uma mutacao em cor de vinho proveniente de um lugar qualquer no Canadá. Em Portugal, estou já a imaginar as manchetes dos jornais da tarde na televisao: 'Sasha e Malia já escolheram e o Primeiro Cao vai mesmo ser Português (exclui-se a parte 'Cao de Água')', seguindo depois a reportagem com o criador nos Azores que teve uma ninhada e vai enviar um deles para o Presidente dentro de uma garrafa , e depois uma entrevista com duas meninas na Covilha que também têm um cao da mesma raca e que o baptizaram de 'Obama', mas que é mais conhecido na rua como o 'Preto'.

    Moral desta digressao aparentemente lunática sobre um tema absolutamente supérfluo: hoje é o Cao de Água, ontem foi o Ronaldo, o Mourinho, o Pedro Pinto, a Paula Rego, o vinho do Porto - os portugueses ainda precisam da aceitacao exterior para aprovar e admirar o que é seu. Apenas porque foi votado ao abandono, é que o Cao de Água Português, um animal que carrega o legado da cultura pescatória portuguesa, se tornou no objecto de mau gosto de pessoas em outros locais do mundo. Pessoas essas que, apesar de tudo, o amaram e preservaram a raca. É por isso que sinto uma certa revolta quando os meios de comunicacao Portugueses se vanglorizam agora com o facto do Cao de Água Português ser o First Dog da era Obama.

    segunda-feira, fevereiro 23, 2009

    Taking the Slum out of 'Slumdog'


    Agora que o filme foi finalmente consagrado com oito (!) Oscars, podemos concentrarmos-nos na temática e controvérsia gerada em torno do mesmo. Neste artigo, publicado ontem no The New York Times, Matias Echanove and Rahul Srivastava, membros da organizacao 'Partners for Urban Knowledge Action and Research', escrevem sobre o que entendem ser uma perspectiva ocidental sobre uma realidade intrinsicamente oriental. Na verdade, mais do que representar uma tragédia humana como muitos ocidentais insistem, os 'subúrbios' de Bombaim sao, para muitos Indianos (e falo de experiência própria pois, já em 2005 quando estive na India, ouvi estas ideias) exemplos da 'Indian Beauty'. Talvez será mais fácil compreender esta ideia se nos lembrarmos das divertidas descricoes de Jorge Amado sobre as favelas do Brasil, tao repletas de vida como geniais do ponto de vista urbano. Ou como canta Seu Jorge: 'A favela, nunca foi reduto de marginal':


    IT does not take much to galvanize protest against a movie in India, but few thought the word “slumdog” would cause so much anger — especially as hundreds of Bollywood titles translate into much worse slurs. We had to pay attention, though, when friends from Mumbai’s sprawling Dharavi area joined hands with those demonstrating against the Oscar-nominated film “Slumdog Millionaire.” The Indian media widely reported that the outrage was over the word “dog.” But what we heard from Manju Keny, a college student living in Dharavi, was something else. She was upset at the word “slum.” We could not agree more.
    In truth, the movie never claims to be a portrait of Dharavi, though some of the most spectacular scenes were shot there, including depictions of the anti-Muslim riots of 1992. The director, Danny Boyle, constructs a cinematic slum out of many pockets around Mumbai. The opening sequence has children playing near the airport, being chased by policemen and ending up — in a moment of pure Hollywood magic — a few miles away in Dharavi.
    The imagery represents what most middle-class residents of Mumbai (and now all over the world) imagine Dharavi to be. The urban legend of its squalor has taken root because few Mumbaikers have ever been there — just as most Manhattanites still avoid stepping anywhere near Bedford-Stuyvesant, that beautiful neighborhood in Brooklyn. Times may have changed since the mid-’70s, when the community worker Barry Stein described Bed-Stuy as the “largest ghetto in the country,” but prejudices die hard, in New York and India.
    Its depiction as a slum does little justice to the reality of Dharavi. Well over a million “eyes on the street,” to use Jane Jacobs’s phrase, keep Dharavi perhaps safer than most American cities. Yet Dharavi’s extreme population density doesn’t translate into oppressiveness. The crowd is efficiently absorbed by the thousands of tiny streets branching off bustling commercial arteries. Also, you won’t be chased by beggars or see hopeless people loitering — Dharavi is probably the most active and lively part of an incredibly industrious city. People have learned to respond in creative ways to the indifference of the state — including having set up a highly functional recycling industry that serves the whole city.
    Dharavi is all about such resourcefulness. Over 60 years ago, it started off as a small village in the marshlands and grew, with no government support, to become a million-dollar economic miracle providing food to Mumbai and exporting crafts and manufactured goods to places as far away as Sweden.
    No master plan, urban design, zoning ordinance, construction law or expert knowledge can claim any stake in the prosperity of Dharavi. It was built entirely by successive waves of immigrants fleeing rural poverty, political oppression and natural disasters. They have created a place that is far from perfect but has proved to be amazingly resilient and able to upgrade itself. In the words of Bhau Korde, a social worker who lives there, “Dharavi is an economic success story that the world must pay attention to during these times of global depression.”
    Understanding such a place solely by the generic term “slum” ignores its complexity and dynamism. Dharavi’s messy appearance is nothing but an expression of intense social and economic processes at work. Most homes double as work spaces: when morning comes, mattresses are folded, and tens of thousands of units form a decentralized production network rivaling the most ruthless of Chinese sweatshops in efficiency. Mixed-use habitats have often shaped urban histories. Look at large parts of Tokyo. Its low-rise, high-density mixed-use cityscape and intricate street network have emerged through a similar Dharaviesque logic. The only difference is that people’s involvement in local development in Tokyo was seen as legitimate.
    Building on what exists, rather than clearing it for redevelopment, may preserve not only the character of a place but also its economic vibrancy. In Dharavi, it would allow all residents to leverage their most precious asset: a place to live and work. Slum-rehabilitation projects in Mumbai often end up creating new slums elsewhere as they increase real-estate value in the places they redevelop.
    In the movie, when the protagonists return to their childhood haunts, they find that multistoried apartments have replaced the old decrepit structures, giving the impression of urban mobility and transformation. What the camera doesn’t reveal are the enormous shantytowns hidden behind those glistening towers, waiting to be redeveloped all over again.
    In many ways, Dharavi is the ultimate user-generated city. Each of its 80-plus neighborhoods has been incrementally developed by generations of residents updating their shelters and businesses according to needs and means. As Ramesh Misra, a lawyer and lifelong resident, puts it: “We have always improved Dharavi by ourselves. All we want is permission and support to keep doing it. Is that asking for too much?”




    Publicado Por:

    terça-feira, fevereiro 17, 2009

    Afogar as mágoas japanese-way

    O ministro da economia japonês foi hoje forcado a apresentar a demissao apos a suspeita de que estaria bebado na conferência de imprensa da reuniao do G7. Embora Shoichi Nakagawa tivesse admitido que o seu estado fosse improprio para a ocasiao, manteve que nao se deveu ao consumo de alcool. Segundo o propio, terao sido os varios comprimidos que consumiu nessa manha os responsaveis pela 'oura'. De uma maneira ou de outra, ficamos com uma ideia bem tremida do que terao sido as discussoes sobre a crise economica...

    domingo, fevereiro 15, 2009

    (Nearly) nothing to fear but fear itself, por Olivier Blanchard

    Num artigo publicado há duas semanas na revista The Economist, o distinguido professor de macro-economia do MIT e economista-chefe do FMI, Olivier Blanchard, oferece-nos um visão clara e pertinente sobre a presente crise económica:


    CRISES feed uncertainty. And uncertainty affects behaviour, which feeds the crisis. Were a magic wand to remove uncertainty, the next few quarters would still be tough (some of the damage cannot be undone), but the crisis would largely go away.


    From the Vix index of stockmarket volatility (see chart), to the dispersion of growth forecasts, even to the frequency of the word “uncertain” in the press, all the indicators of uncertainty are at or near all-time highs. What is at work is not only objective, but also subjective uncertainty, or what economists, following Chicago economist Frank Knight’s early 20th-century work, call “Knightian uncertainty”. Objective uncertainty is about what Donald Rumsfeld (in a different context) referred to as the “known unknowns”. Subjective uncertainty is about the “unknown unknowns”. When, as today, the unknown unknowns dominate, and the economic environment is so complex as to appear nearly incomprehensible, the result is extreme prudence, if not outright paralysis, on the part of investors, consumers and firms. And this behaviour, in turn, feeds the crisis.

    It affects portfolio decisions. It has led to a dramatic shift away from risky assets to riskless assets, or at least assets perceived as riskless. It sometimes looks as if investors around the world only want to hold American Treasury bills. Why? At the start was the realisation that many of the new complex assets were in fact much riskier than they had seemed. This realisation has now morphed into a general worry about nearly all risky assets, and about the balance-sheets of the institutions that hold them. “Better safe than sorry” is the motto. Unfortunately, while the motto may make sense for individual investors, it is having catastrophic macroeconomic consequences for the world. It is triggering enormous spreads on risky assets, a credit crunch in advanced economies, and major capital outflows from emerging countries.


    It affects consumption and investment decisions, and is largely behind the dramatic collapse in demand we have observed over the last three months. Sure, consumers have lost a good part of their wealth, and this is reason enough for them to retrench. But there is more at work. If you think that another Depression might be around the corner, better to be careful and save more. Better to wait and see how things turn out. Buying a new house, a new car or a new laptop can surely be delayed a few months. The same goes for firms: given the uncertainty, why build a new plant or introduce a new product now? Better to pause until the smoke clears. This is perfectly understandable behaviour on the part of consumers and firms—but behaviour which has led to a collapse of demand, a collapse of output and the deep recession we are now in.





    So what are policymakers to do? First and foremost, reduce uncertainty. Do so by removing tail risks, and the perception of tail risks. On the portfolio side, establish a price, or at least a floor on the price, of the troubled assets. Ring-fence them or take them off bank balance-sheets. On the consumption side, commit to do whatever it will take to avoid a Depression, from fiscal stimulus to quantitative easing. Commit to do more in the future if necessary. Above all, adopt clear policies and act decisively. Do too much rather than too little. Delays in financial packages have cost a lot already. Further rounds of debate will stoke uncertainty and make things worse.



    Second, undo the effects of uncertainty on the portfolio side, and help recycle the funds towards risky assets. The standard advice here is to return the private financial sector to health through recapitalisation. That is absolutely right, but easier said than done. And, while damage is slowly repaired, it makes sense for states to recycle part of the funds themselves. To caricature: if the world loves American Treasury bills but the funds would be more useful elsewhere, then the government should issue the bills, and use the proceeds to channel the funds where they are needed. It should buy some of the riskier assets, and return some of these funds back to emerging-market countries to offset capital outflows. This is indeed close to what America’s Federal Reserve is now doing with quantitative easing at home and swap lines to foreign central banks. The only difference is that the Fed issues money rather than treasury bills in exchange for its purchases. It would make more sense for the Treasury to be involved, and to separate more clearly the role of fiscal and monetary policy, but, in the current state of play, this is a minor wrinkle. Either will do.



    Retail therapy
    Third, undo the effects of the wait-and-see attitudes of consumers and firms on the demand side. Get them to spend more, and have the state do some of the spending itself. Offer incentives to buy now rather than later; for example, temporary subsidies to consumers who turn in a clunker and buy a new car, a measure adopted in France. Increase spending on public infrastructure, a central component of President Barack Obama’s programme. Both types of measures are indeed present in the fiscal programmes more and more countries are putting in place. If tailored and communicated well, these programmes cannot only stimulate and replace private demand, but also convince consumers and firms that they are not in for another Depression. This will ensure that they stop waiting and start spending again.



    Coherent financial, fiscal and monetary measures are all needed. All three will have direct effects on demand. But, as importantly, they will help reduce uncertainty, lower risk spreads, and get consumers and firms spending again. If policymakers act decisively, private demand will recover sooner rather than later. And, within a year or less, we can be on the path to recovery.
    Publicado por:

    quarta-feira, fevereiro 11, 2009

    Ou a Paz pela Guerra (Segunda Parte)

    Este artigo, que sucede o post publicado em Janeiro sobre a ofensiva Israelita sobre Gaza (pode ser encontrado nos arquivos), foi escrito há mais de duas semanas atrás. Hoje, quando os primeiros resultados (ainda não totalmente certos) dão a vitória a Tzipi Livni nas urnas Israelitas, parece-me mais actual do que nunca uma leitura do conflicto israelo-árabe sobre o prisma político.




    Segunda Parte:


    Sobre a luz desta teoria, podemos agora olhar com maior claridade para a história da região nos últimos meses. Na verdade, o presente conflito tem mais que ver com a evolução da política interna em Israel e nos Territórios Palestinianos do que com considerações geopolíticas do século XXI. Comecemos então com Israel. Em Julho do ano passado, após a revelação pública do envolvimento de Ehud Olmert, actual Primeiro-Ministro, num processo de corrupção, são convocadas novas eleições para a liderança do partido centrista Kadima. Em Setembro de 2008, a Ministra dos Negócios Estrangeiros, Tzipi Livni ganha as eleições internas do Kadima por uns meros 431 votos (1%) e começa negociações tendo em vista a renovação da coligação de governo. Porém, os partidos mais conservadores, nomeadamente o Shas, Meretz-Yachad e o Judaísmo Unido da Torah, decidem abandonar a coligação e alinhar com o Likud, agora liderado por Benjamin Netanyahu. Deparando-se então com um impasse político, o Presidente do Estado de Israel, Shimon Peres, convoca eleições legislativas para Fevereiro de 2009.


    Nas semanas seguintes, as sondagens revelam a sucessiva perda de popularidade de Livni face à ascensão de Netanyahu, descortinando uma eventual reviravolta nas altas esferas políticas de Israel. As consequências desse desfecho para o processo de paz adivinhavam-se catastróficas. Com efeito, não é a primeira vez que tal cenário se apresenta. Entre 1996 e 1999, Benjamin Netanyahu foi Primeiro-Ministro de Israel, sendo hoje considerado como o mais conservador que alguma vez ocupou o cargo. A sua posição face aos Palestinianos ficou conhecida como a postura dos “três nãos: não à retirada dos Montes Golans; não às negociações sobre Jerusalém; e não às negociações com pré-condições.” Nas memórias de Dennis Ross, o assessor de Bill Clinton para o Médio Oriente, Netanyahu surge não só como uma personagem ‘intratável’, mas como o grande culpado pelo impasse em que caíram as negociações no final dos anos 90. A provável reeleição de Netanyahu como Primeiro-Ministro em Fevereiro de 2009 certamente acarretaria consigo semelhantes, ou porventura piores, efeitos para o processo. Isto porque já não estamos nos anos 90 e a conjuntura internacional, nomeadamente no Médio Oriente, sofreu uma grave deterioração.


    Entretanto, o Hamas, envolto na velha contenda com a Fatah pelos ‘hearts and minds’ dos palestinianos, decide não renovar o cessar-fogo celebrado com Israel em Junho de 2008. Deste modo, o Hamas pretende alcançar dois objectivos. Por um lado, declara o final do mandato de Mahmoud Abbas e reclama a convocação imediata de eleições nos territórios palestinianos, acreditando que poderá tomar o governo não só na faixa de Gaza, mas também na Cisjordânia. A chegada do Hamas ao poder significaria, desde logo, um regresso do processo de paz ao ponto inicial. Com efeito, o movimento não subscreve a Declaração de Princípios de 1993, na qual Arafat (Fatah) reconheceu o direito de Israel existir no território. Pelo contrário, o Hamas define-se pela reclamação do estado Palestiniano em todo o espaço hoje ocupado por ambos Israel e pela Autoridade Palestiniana.



    Porém, e acima de tudo, o lançamento sucessivo de rockets e mísseis contra o sul de Israel destinaram-se a enfraquecer a posição da recém-eleita Livni e do ‘campo de paz’ no país vizinho. O sucesso da estratégia é ilustrado pela mobilização da opinião pública israelita contra a tolerância do governo face ao ‘terrorismo’ palestiniano e a um processo de paz errático. Ao mesmo tempo, a táctica do Hamas fortalece a posição de Netanyahu nas sondagens e aproxima o final do processo de paz. É certo que não passou também despercebido ao Hamas o final de mandato de George W. Bush, o grande promotor desta iniciativa de paz. A chegada à Casa Branca de um novo líder que prometia um ‘mudança’ na forma da América se relacionar com o mundo (leia-se, uma transformação nas relações com o Irão e possivelmente também com o Hamas) incitava à antecipação da rotura com o actual processo de paz e a uma reformulação das posições no Médio Oriente.


    Perante esta conjuntura, restam apenas duas alternativas a Tzipi Livni: tentar renegociar com o Hamas o cessar-fogo, sobre elevadas probabilidades de falhar e eventualmente perder as eleições em Israel; ou fazer uma demonstração de forças em Gaza para provar ao Hamas (e também aos Iranianos) que está atenta, mas sobretudo para reconquistar a confiança do povo Israelita. Entre as duas, optou pela última. Desde de então, os eventos desenrolaram-se perante nós com uma cadência dramática que, julgo eu, apanhou de surpresa Palestinianos e Israelitas. Nos jornais e nas televisões, comentaristas das mais diversas origens denunciaram Israel, acusaram o Hamas e dissertaram sobre a ‘insolvência do problema’. Até porque, em larga medida, a estratégia jogou contra os interesses dos que defendem o processo de paz: a opinião pública mundial tornou-se contra Israel e a sua cara mais visível, Tzipi Livni; o Hamas não foi exterminado, mas pelo contrário, afirmou-se como o genuíno defensor da causa palestiniana; e um re-enegrecimento das relações entre as populações da faixa de Israel, Gaza e da Cisjordânia.


    Porém, no objectivo a que se propôs atingir, a estratégia está perto de alcançar sucesso. Foi esse o propósito de manter o Kadima no poder e assim salvar o processo de paz. Uma sondagem realizada recentemente mostra que Netanyahu mantém a liderança nas sondagens (com 29 lugares dos 120 no Parlamento Israelita), mas demonstra que Livni está agora mais perto da vitória (25 lugares). De qualquer forma, uma margem pequena entre os dois partidos possibilita não só a entrada de um partido mais conciliatório numa eventual coligação de governo, como também a formação de uma maioria governante pelo Kadima e porventura os Trabalhistas. Logo, as próximas duas semanas, as últimas antes das eleições, serão decisivas para o futuro do Médio Oriente. Contudo, em última análise, queda a pergunta se os fins, mesmo para alcançar um bem tão prezado como a Paz, justificam os meios, nomeadamente a morte de inocentes. Eu prefiro pensar que não, mas compreendo os que pensam que sim.


    Texto e fotografia: Diogo Lemos

    segunda-feira, fevereiro 09, 2009

    F.C.Porto 1 - 1 Benfica: Portistas seguram liderança com um penálti falso

    O título não é meu. É do 'Público online' às 21:37 de ontem, pouco depois do final da partida (presumivelmente estará hoje na edição impressa do jornal). O autor do artigo, publicado como 'notícia', é o jornalista Bruno Prata, que pouco deixa a adivinhar sobre a sua afiliação clubística: desde 'Pedro Proença (o árbitro) não fez jus ao antigo cartão de sócio', ao 'símbolo do Benfica demasiado pequeno e desproporcionado' nos ecrãs do estádio que não teve correspondência no campo, até à 'facilidade insultante' com que o Benfica controlou o jogo. É verdade, não percebo muito de futebol; mas posso afirmar com confiança que este relatório não ilustra o jogo que vi na televisão. Acima de tudo, parece incrível que um jornal que se refere 'de qualidade' tenha a prepotência ou a falta de bom-senso para publicar um artigo incrivelmente parcial. Por esse motivo, deixei o meu comentário no site do jornal, convido-os a fazer o mesmo:

    quinta-feira, fevereiro 05, 2009

    A Natureza como Arte

    ('The Loss of the Lisbon Rhinoceros', 2008, Walton Ford)

    O New Yorker da semana passada apresenta o pintor Walton Ford, a nova coqueluche da arte Norte-Americana. Segundo o artigo, o tríptico acima exibido, entitulado 'The Loss of the Lisbon Rhinoceros', terá sido o centro das atenções da sua última exposição, na Paul Kasmin Gallery de Chelsea. O quadro inspira-se em relatos da viagem em 1915 da embaixada do Rei Don Manuel II de Portugal ao Papa Leão X. Reza a história que uma das naus, onde incidentalmente seguia este animal, o primeiro rinoceronte visto em toda a Europa desde o tempo dos Romanos, naufragou ao largo de Genova. Ford ilustra a tragédia do ponto de vista do animal que ergue a cabeça para desvendar os primeiros contornos de terra firme, sabendo que não a poderá alcançar pois está agrilhoado ao mastro do navio. No fundo, e como nos leva a crer o New Yorker, toda a obra de Ford se concentra no sofrimento provocado pela acção do Homem sobre a natureza. A técnica usada é a aguarela, seguindo a tradição dos gravuristas da vida animal, nomeadamente John James Audubon, o primeiro a contextualizar os sujeitos com uma narrativa:

    ('Pinned Grous', J.J. Audubon)

    O resultado final de Ford, e a sua contribuição para a História da Arte, é alcançado através da harmonização destas gravuras com o dramatismo operático do pintor neo-clássico françês, Theodore Géricault:

    ('The Raft of the Medusa', Theodore Géricault)

    O resultado parece-me muito interessante, não só pela contemporâneadade do tema mas sobretudo pelo meu próprio fascínio pela vida animal. Tal como Ford que passou a infância a observar as gravuras de Audubon, também eu passei a minha acompanhado do Fábulas de La Fontaine que o meu avô me ofereceu. Esse fascínio pela magia da natureza reencontra-se agora com estas imagens.

    segunda-feira, fevereiro 02, 2009

    As melhores notícias 'não-essenciais' desta segunda-feira

    (More than 1000 people lined up in Miami to apply for 35 open firefighter positions - 'NYTimes')

    'Children paying price for adults' pursuit of success, report says', The Guardian:
    http://www.guardian.co.uk/society/2009/feb/02/children-wellbeing-success

    'Telmo Moreira ganha prémio do público no Prix de Lausanne', Público:
    http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1358378

    'In Bolivia, a tight grip on the next big resource', New York Times:
    http://www.nytimes.com/2009/02/03/world/americas/03lithium.html?_r=1&hp

    'Sonntag: The Precocious Years', New York Times:
    http://www.nytimes.com/2009/02/01/books/review/Sante-t.html

    'A distania Reuters acabou, mas a agência continua a dar notícias, incluindo esta', Público:
    http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1358449