
A Gaivota Farragulha
terça-feira, março 31, 2009
Eleições Europeias 2009 Pirateadas

Compreender o Paquistão - 2
4 - O momento definidor da breve história do Paquistão teve lugar em 1971. Após anos de discriminação e negligência, a parte oriental do país (Paquistão Oriental, hoje Bangladesh) inicia uma campanha em direcção à obtenção da independência. A expansão da revolta dentro do território Paquistanês representa para a Índia uma oportunidade fabulosa para dar um golpe fatal no seu fiel inimigo. O apoio militar e financeiro indiano à região oriental do Paquistão permite aos rebeldes ganhar a guerra de independência em 1971 e assim declarar a independência do novo país. As consequências deste desenvolvimento para o futuro do Paquistão não podem ser subestimadas. Em primeiro lugar, a independência do Bangladesh deitou por terra qualquer pretensão do nacionalismo indiano-muçulmano ao efectivamente dividir os muçulmanos do sub-continente em dois países. Ao mesmo tempo, a independência do território oriental serviu de exemplo e motivo de alento para outros grupos secessionistas do Paquistão ocidental, como os Baluchistaneses (que ocupam um território entre o Irão e o Paquistão) e os Sindhis (no sul, na zona de Karachi). Com efeito, nos meses que se seguiram à guerra, o Estado Paquistanês teve que dispor de meios militares para impedir a completa fragmentação do país. Em suma, e como escreveu o académico Tarik Ali, a independência do Bangladesh foi a sentença de morte à espera de ser concretizada que pairou sobre o Paquistão desde 1971.

(Uma família num subúrbio de Rawalpindi, a cidade militar, em 2008. AP)
5 - A deterioração política do Paquistão resultou de e solidificou um sistema de oligarquia económico. Na realidade, os próprios Paquistaneses referem-se ao poderia extraordinário de alguns como as famosas '22 famílias'. O termo foi primeiro empregado em 1968 por Mahbubul Haq, Economista Chefe da Comissão de Planeamento, para descrever a circunstância de 22 famílias Paquistanesas deterem aproximadamente 66% da riqueza industrial do país e 87% das instituições financeiras e seguradoras no país. A estas famílias, nomeadamente os Saigols, Dawoods, Habibs, Adamjees, Bawany, Hashwani, Sharifs de Ittefaq (família de Nawaz Sharif, principal político da oposição actualmente) e os Sheikhs, vieram juntar-se mais tarde os Bhuttos (actualmente entre os mais ricos no país). A expansão do poderio económico, político e militar destas famílias, que amiúde cultivaram casamentos endogâmicos de forma a preservar um círculo fechado, foi directamente proporcional ao empobrecimento da população em geral. A situação foi particularmente manifesta durante a década de 90, durante os governos democráticos de Bhutto e Sharif, em que a riqueza e opulência dos políticos não encontrava qualquer tipo de paralelismo na realidade dura do povo paquistanês. Na verdade, na época, não era invulgar ver homens a pagar fogo a si próprios perante o desespero de não poder sustentar as famílias. Com o dealbar do século XXI, a situação tornou-se ainda pior devido à forte desaceleração da economia paquistanesa.

(Castigo público em Karachi em 1980)
6 - A crise do nacionalismo indiano-muçulmano preconizou a escalada do 'rigorismo' religioso nos anos 70 como uma solução para o vácuo de identidade do Paquistão. Foi o próprio Zulfijar Ali Bhutto que introduziu ao país as primeiras regras jurídicas retiradas da sharia (código islâmico). Todavia, foi durante a ditadura do General Zia ul-Haq na década de 80 que esse processo de islamização viveu os seus dias mais energéticos, antecedendo mesmo a experiência dos talibans no Afeganistão. Para além da já bem conhecida proliferação de escolas islâmicas durante este período (madrasahs), Zia legitimou os tribunais de Sharia, os castigos corporais (como, por exemplo, o apedrejamento pelo crime de adultério ou a amputação da mau direita pelo crime de furto) nos tribunais civis, a proibição total da venda de bebidas alcoólicas, leis contra a blasfémia, e ainda uma compreensiva islamização da economia que incluiu a introdução do pagamento obrigatório da zakat e ushr (contribuições religiosas para os pobres). O processo de islamização teve também fortes contornos externos que discutiremos a seguir. Apesar das grandes reformas efectuadas nesta direcção, no final do regime de Zia, a maior parte da população paquistanesa parecia desgastada com o zelo religioso dos seus líderes. Por este motivo, durante os primeiros governos democráticos dos anos 90, principalmente nos de Benazir Bhutto, foi possível revogar grande parte das cláusulas islâmicas e redireccionar o país no sentido de uma identidade cívica. Porém, a pobreza da população e as graves falhas do Estado Paquistanês permitiram a manutenção e, com efeito, a crescente expansão das madrasahs por todo o território nacional. O sucesso destas instituições residiu no facto de proporcionarem não só educação, mas também alimentação e roupa aos seus estudantes, o que levou muitos pais a enviar os seus filhos para madrasahs. Porém, é importante olhar para as madrasahs com alguma cautela pois não existem valores certos sobre a expansão destas instituições e também devido ao seu carácter diversificado: diferentes vertentes do Islão são ensinadas nas madrasahs paquistanesas; algumas funcionam como escolas a tempo inteiro, outras como ocupação de tempos livres e outras ainda durante períodos do ano.
FIM DA SEGUNDA PARTE
segunda-feira, março 30, 2009
Compreender o Paquistão


(Mohamed Ali Jinnah, o 'pai' do Paquistao aparece na capa da revista Time em 1946)
2 - De acordo com o plano de partição apresentado pelo Lord Mountbatten, algumas províncias da Índia Britânica teriam a oportunidade escolher entre a integração no território indiano ou paquistanês. Uma dessas províncias foi o principado de Jammu e Kashmir, governado por um Maharaja hindu, Hari Singh, mas predominantemente populada por muçulmanos (aproximadamente 77%). Inicialmente, o Maharaja inclinou-se para a integração do território com o Paquistão mas perante alguma impaciência e agressividade dos negociadores paquistaneses decidiu optar pela opção indiana. Nessa altura, o exército do recém-formado Paquistão decidiu invadir o território provocando um contra-ataque das forcas indianas que levou à primeira guerra pelo território de Kashmir entre 1947-48. O conflito levou à divisão do território pela chamada 'Line of Control' (LOC), em que aproximadamente um terço da província ficou em posse paquistanesa, e metade permaneceu indiano. O último terço do território, a nordeste, foi entretanto cedido pelos paquistaneses à República Popular da China que tinha vindo a enviar tropas para a região. Em 1948, uma resolução do Conselho de Seguranca da ONU recomendou a convocação de um referendo sobre o futuro de Jammu e Kashmir que até hoje ainda não foi marcado.

(A Linha de Controlo em Kashmir)
3 - A questão de Kashmir marcou tremendamente o futuro do Estado Paquistanês. Acima de tudo, a guerra levou à expansão e enobrecimento das forcas armadas paquistanesas dentro do aparelho de Estado. Logo em 1958, o General Ayub Khan assumiu as rédeas do país num golpe de estado que introduziu o país às ditaduras. Khan governou até 1969, quando foi substituído por outro general, Yahya Khan, que governou também em ditadura. Foi apenas em 1972, após uma viragem na história do país (que falaremos a seguir), que o Paquistao regressou à democracia com o governo de Zulfikar Ali Bhutto, pai de Benazir Bhutto. No entanto, sete anos mais tarde, em 1979, Bhutto foi deposto, condenado à morte e enforcado por um novo golpe de estado militar, desta feita liderado pelo General Zia ul-Haq. Zia governou por quase dez anos até 1988, quando morreu num misterioso acidente de avião. O Paquistão regressou então de novo ao universo das democracias com a eleição da primeira mulher Primeira-Ministra do país, Benazir Bhutto. Dentro e fora do país respirava-se finalmente a esperança de que o Paquistão estava a enveredar no caminho certo. Porém, apenas 20 meses mais tarde, Benazir Bhutto foi deposta sobre suspeitas de corrupção. Nos anos seguintes, o governo paquistanês foi intermitentemente ocupado por ela e pelo maior político da oposição, Nawaz Sharif, embora nunca por mandatos completos. Na verdade, foi durante a década de 90, o maior período contínuo de democracia no Paquistão, que se verificou a maior deterioração da estabilidade política e económica do país. Este período chegou abruptamente ao fim em 1999 com o golpe de estado liderado pelo General Pervez Musharraf. Este governou, também em ditadura, até 2008. Ao todo, desde da independência até hoje, o país passou 30 anos de democracia e 31 de ditadura militar.

(Zulfikar Ali Bhutto cumprimenta Indira Gandhi, a 28 de Junho de 1972, numa tentativa de atenuar as relaccoes entre os dois países vizinhos, na presenca da filha Benazir)
FIM DA PRIMEIRA PARTE
quinta-feira, março 26, 2009
A batalha pelo Índico e o novo colonialismo
As ilhas Mayotte pertencem ao arquipélago dos Comodoros, ancorado entre o norte de Moçambique e a ilha de Madagáscar. Nos guias turísticos assim como nas fotografias encontradas pela net, Mayotte bem poderia ser o paraíso na terra. Composto por uma ilha principal (Grand Terre ou Mahoré), uma mais pequena (Petit-Terre ou Pamanzi) e vários ilhéus em torno destas, Mayotte tem um clima tropical, um terreno rico de origem vulcânica e uma fauna e flora diversa. Porém, a sua beleza não se resume a aspectos estéticos e naturais. Mayotte atravessou a história da humanidade como um importante interposto comercial no Oceano Indico. Desta convergência de gentes e culturas resultou uma sociedade miscigenada entre povos Europeus (onde também deverá correr sangue português), Árabes, Africanos e Asiáticos.
Após anos de letargia e esquecimento, Mayotte regressa este fim-de-semana aos anais da história. A questão remonta ao fim do domínio francês sobre as ilhas Comodoro (entre 1833-1974), em que os habitantes da ilha optaram, em referendo, por manter as ligações institucionais com a Franca ao revés da inclusão no território nacional das ilhas Comodoro. O resultado foi repudiado pelo recém-formado governo das Comodoro e, em 1976, uma resolução das Nações Unidas, apoiada por 11 dos 15 membros do Conselho de Segurança, reconheceu a soberania de facto da União das Ilhas Comodoro sobre o território. No entanto, a Franca, como membro permanente, vetou a resolução e o destino das ilhas permaneceu no limbo durante as próximas décadas.
A disputa poderá todavia ficar resolvida este fim-de-semana com o referendo sobre a integração das ilhas no território ultramarino Francês. De acordo com as últimas sondagens, 70% da população irá votar a favor da proposta. A ideia parece-me desde logo uma forma mais sofisticada ('dare I say, afrancesada') de colonialismo. Ao contrário da experiência passada, o colonialismo do séc. XXI baseia-se nos princípios de sufrágio universal, liberdade de opção e democracia - por cá, não me importaria nada de ver Cabo Verde reintegrado no território português por referendo. Porém, resta saber se os resultados serão muito diferentes dos do passado (os habitantes de Guadalupe teriam certamente alguns conselhos a dar aos seus futuros compatriotas Mayottes).

Acima de tudo, o que está aqui em jogo é muito mais do que o direito dos Mayottes adquirirem ou não o passaporte francês, ou da instalação de mais um Club Med, mas sim uma importante demarcação estratégica do Estado Francês. O que está em jogo é a partilha do Índico. Na edição do mês passado da revista Foreign Affairs, o jornalista americano Robert D. Kaplan (por acaso, casado com uma portuguesa, Maria Cabral) escrevia que o Oceano Índico será o palco do século XXI. Lá estão as áreas de influência geográfica dos poderes emergentes, a China e a Índia, as maiores reservas do cada-vez-mais-escasso petróleo (na península Arábica, no Irão, no Kuwait e no Iraque); lá estão os grupos terroristas mais activos em todo o mundo e as disputas territoriais mais importantes do planeta - à excepção do conflito israelo-árabe; lá estao alguns dos centros económicos mais importantes do novo mundo, como Mumbai; e por lá passa a maior parte do comércio mundial.
O referendo vem trinta anos depois da independência, mas apenas um mês depois do Presidente Iraniano Mahmoud Ahmadinejad visitar o arquipélago (conseguem imaginar o Senhor Ahmadinejad a passear de chinelos na mão, debaixo dos coqueiros?). A crescente influência iraniana sobre a região é notória na quantidade de escolas e mesquitas financiadas por capitais iranianos e pelo facto de o próprio presidente do país, Ahmed Abdallah Mohamed Sambi, ter estudado no Irão. Portanto, e para parafrasear alguém com propensão natural para repetir clichés, não há coincidências...
quarta-feira, março 25, 2009
O julgamento do assassínio de Anna Politkovskaya

Aos interessados em literatura, cinema, jornalismo, policiais, thrillers, casos de espionagem, direitos-humanos, justica, liberdade de imprensa, geopolítica, assuntos contemporâneos, na Russia, na Russia de Putin, na Guerra na Chechenia ou apenas por Anna Politkovskaya, a jornalista russa assassinada em 2006 ao entrar no elevador do seu prédio em Moscovo, este é um texto imperdível. Na minha opiniao, diria que esta é a melhor reportagem que li até hoje sobre um julgamento (em inglês diria que esta é, 'the ultimate trial story'). Escrito por Keith Gessen, crítico literário, editor e escritor (o seu primeiro livro, 'All the Sad Young Literary Men' - que agora serei forcado a ler - foi publicado no ano passado) americano de origem judia russa, o artigo foi publicado na revista New Yorker da semana passada. A qualidade do texto, o rocambulesco suspense da trama e a perspicaz visao sobre a Russia mantiveram-me esta noite acordado até às 2.30 da manha. No intuito de partilhar esta maravilha com todos vós, proponho-me entao a serializar o texto quase intregalmente nas próximas quartas-feiras. Caso tenham dificuldades em acompanhar a reportagem no blog, sugiro que a imprimam para ler à noite. Aqui fica a primeira parte, 'for your eyes only':
The first day I tried to attend the trial of the men accused of organising and abetting the murder of the journalist Anna Politkovskaya, my papers weren't in order and I didn't get in. I walked across the street to a Starbucks and for the rest of the day read a tall stack of printouts I'd made about the case from the Web site of Novaya Gazeta, Politkovskaya's old paper. While I sat there, a young human-rights lawyer was shot in the back of the head right outside the subway stop I'd got out of that morning. He was accompanied by a twenty-five-year-old Novaya Gazeta freelancer. The assassin shot and killer her, too, before ducking into the subway and getting away. The next day, I was allowed into the trial.
Anna Politkovskaya was murdered as she came home with some groceries on a Saturday afternoon, October 7, 2006, Vladimir Putin's birthday. The killer waited inside her entryway and shot her when she got into the elevator. He shot her three times from outside the elevator, and then, when she fell from the impact, stepped into the elevator and shot her two more times. Politkovskaya was forty-eight years old, and very thin. In photographs, as a younger woman, she is attractive but plain; in middle age, with her dark features and short, gray hair, she had become striking. On the day of the murder, she wore black pants and a black vest. At the trial, the prosecutors handed around the bullets recovered from her body and showed a large colour photograph of Politkovskaya crumpled on the elevator floor, blood seeping from the wounds in her head, the murder weapon with its long black silencer next to her right hand, which still clutched a plastic bag full of groceries.
It was hard to know who would have had more cause to kill Politkovskaya: Putin and his Federal Security Bureau (F.S.B.) cohort, which she'd mercilessly critized; the pro-Kremlin Administration of Chechnya, which she excoriated; or elements of the Russian military in Chechnya, some of whom Politkovskaya had helped put in jail. And why would the murder have happened on Putin's birthday? Cornered a few days later while on a trip to Germany, Putin had reacted defensively. Politkovskaya's death, he said, would do more harm to Russia than her reporting ever did. When, three weeks afterward, an F.S.B. defector was poisoned in London by a rare radioactive isotope, one opposition journalist even took it to be a demonstration of sorts, a way of saying, Here's what a government-sponsored killing actually looks like.
By all accounts, Putin wanted the Politkovskaya killers found, and the investigators were not without clues. Politkovskaya's entryway had a video camera, and her building was next door to the Moscow headquarters of VTB, the country's second-largest bank; all told, there were eight video cameras in the vicinity of the crime. In the days before the killing, they had captured a beat-up green Lada station wagon circling Politkovskaya's building. On October 7th, they recorded the Lada parking around the corner at 2:24 P.M. After an hour and a half, a man emerges from it, walks towards Politkovskaya's building with a jacket wrapped around his left hand, and then enters. The man is thin and wears a baseball cap that shields his face. A few minutes later, a camera shows Politkovskaya approaching the building with her grocery bag, rummaging in her purse for her keys, and going in. Less than a minute later, the man in the baseball cap walks out.

(NTV/AFP/Getty Images - Imagens do principal suspeito gravadas pelas câmaras de seguranca)
Investigators were able to determine that the owner of the Lada was a native of Chechnya named Rustam Makhmudov. He was the nephew of a well-known mobster and had been wanted by federal authorities since 1997 for kidnapping; for most of that time, he lived in Moscow under an assumed name. Despite being on the run, Makhmudov had interesting friends - in particular, an F.S.B. agent and a former police detective with a federal brief (the equivalent of an F.B.I. agent). At this point, the investigators seemed to catch a break: a colleague of the detective came forward to testify that in the fall of 2006, just weeks before Politkovskaya was killed, the former detective had offered to forgive a large debt that the colleague owed if he carried out surveillance on her.
In August, 2007, ten months after the murder, the arrests began: Rustam Makhmudov had disappeared, but police arrested the F.S.B. agent, the former police detective, and nine others, including three of Rustam's brothers. The Russian prosecutor general held a press conference at which he announced that the case had been solved. At first, investigators fingered the youngest of the Makhmudov brothers, Tamerland, as the shooter, but Tamerland was able to establish that he had been in Chechnya in the fall of 2006. But cell-phone records established that Rustam's two other brothers had been in the vicinity of the crime when it happened. What's more, the pattern of their calls was suspicious. Investigators knew from the bank cameras that the shooter had left the green Lada and entered Politkovskaya's building at 3:55 P.M. They now found that at 3:52 P.M. the two brothers had had a cell-phone conversation for a few seconds. The killer left the building at 4:07 P.M. Another short phone call between the brothers took place at 4:08 P.M. The investigators concluded that the shooter was Rustam, and that his two brothers served as his driver and lookout.
That, anyway, was the story the prosecution took to court in mid-November, when the trial began. By then, seven of the original suspects had been released, leaving the two brothers, the former police agent, and the F.S.B. agent. (...) So for three months the two young Chechens and the two members of the law enforcement community sat together in a yellow steel cage.
Final da Primeira Parte
segunda-feira, março 23, 2009
Incêndios de Marco

quinta-feira, março 19, 2009
O Papa e os Preservativos
Segundo a UNaids, dos 33 milhões de pessoas no mundo infectadas com o vírus da sida em 2007, 22 milhões habitam na África subsaariana. Destes, 12 milhões são mulheres com mais de 15 anos e 1 800 000 são crianças. Mormente, três quartos dos dois milhões de pessoas que morreram de doenças associadas ao vírus da sida em 2007 viviam na África subsaariana. Ontem, a agência da ONU voltou a afirmar que os preservativos são uma parte importante do combate contra o HIV, que infecta diariamente mais de 7000 pessoas.
Conseguiríamos porventura compreender as declarações do Papa, se habitássemos um mundo ideal em que todos tivéssemos acesso às mesmas condições de educação, serviços de saúde e fossemos mesmo capazes de conter os nossos impulsos mais instintivos. Mas, felizmente ou infelizmente, o nosso mundo é tremendamente imperfeito. Principalmente em África, onde o uso do preservativo é uma questão de vida ou morte. Por isso, as palavras do Papa suscitam dúvidas se ele partilha da mesma realidade ou reside numa redoma de perfeição em que a pobreza, a ignorância e a injustiça são meros conceitos. Manter-se nessa última posicao, prejudica nao só o Papado e a Igreja Católica, mas todos aqueles que se mantém fiéis à sua doutrina. Sendo líder espíritual de uma comunidade de crentes, o Papa deveria mostrar-se mais a par da realidade humana quando desejar intervir em assuntos materiais.
P.S.: Numa nota mais light, escolhi esta fotografia porque nela aparece a Primeira-dama dos Camarões, Chantal Byia, conhecida pelos seus elaborados penteados como bem ilustra a fotografia. Não deixa de ser irónico que critiquemos o Papa sem criticar também aqueles que fazem do poder em África um veículo de extravagâncias.
terça-feira, março 17, 2009
A Revolucao DIY

Uma pequena busca no google com as palavras 'DIY' ou 'DIY fest' demonstra que na América do Norte e na Europa Central existe já uma multiplicidade de festivais direccionados para a produção caseira de todo o tipo de bens. Nesses festivais apresentam-se não só os primeiros resultados do DIY, como também se organizam workshops para ensinar a audiência a fazer o upload de um vídeo para o Youtube; a reciclar um computador ou a construir um painel solar caseiro.
Para quem ainda não estiver convencido, a revista 'TIME' desta semana aponta as 'survival-stores' como uma das 10 ideias que estão a mudar o mudar o mundo neste momento (http://www.time.com/time/specials/packages/article/0,28804,1884779_1884782_1884768,00.html). Apesar do nome um tanto-ou-quanto ambíguo (com efeito, no google as 'survival-stores' são ainda uma reserva do midwest americano, armazéns onde se vendem bunkers nucleares, armas para combater aliens e arcas para sobreviver dilúvios), as survival-stores respondem aos desejos éticos, económicos e estéticos dos consumidores do futuro. Mais do que grandes superfícies onde se vendem mobiliário e instrumentos DIY, como a BRICO ou o IKEA, as survival-stores irão possuir também workshops de yoga, culinária saudável ou informática, centros especializados em ciclismo e desportos de aventura, consultas de medicina alternativa e, claro, uma secção com topo o tipo de apetrechos de tecnologia ecológica. No fundo, as survival-stores serão os novos centros-comerciais do bem-estar DIY. Mal posso esperar por ver essa reconversão no Norte Shopping...
segunda-feira, março 16, 2009
O difícil caminho para a paz

- O estabelecimento de um juramento de fidelidade ao Estado de Israel, incluindo a disponibilidade para integrar as forcas militares, por todos os Israelitas (incluindo os Israelitas Árabes que representam 15 a 20%) como condicao para a cidadania;
- A troca dos territórios Israelitas mais habitados por Israelitas Árabes pelos colonatos nos territórios ocupados da Cisjordânia - terras essas que nao possuem, necessariamente, a mesma qualidade agricola.
As consequências deste desenvolvimento poderao, de facto, ser trágicas para o Médio Oriente. Porém, a possibilidade continua a existir de, na eventualidade de haver negocioes sobre o 'end game', os políticos da direita israelita se demonstrarem mais preparados para tomar as díficeis decisoes do que os seus parceiros no centro. Tudo depende de como, nos primeiros meses, o novo governo Israelita se demonstrar perante o processo de paz e a nova administracao americana. Caso contrário, caso as nossas piores suspeitas sobre os senhores Netanyahu e Lieberman se vierem a confirmar, o processo de paz estará terminado.
sábado, março 14, 2009
Filmes para a geração Youtube

(IFC - New York Times)
Levando mais além a ideia de cinema independente, os filmes ‘mumblecore’ são micro-produções caseiras em que um grupo de actores, geralmente amadores, representa situações embaraçosas da vida privada. A denominação ‘mumblecore’, inventada em 2005 pelo técnico de som Eric Masunaga durante o South by Southwest Film Festival (SXSW) para descrever um filme em que tinha trabalhado, refere-se aos balbucios das personagens e captura o humor dividido entre a frustração e a expectativa dos jovens pós-universitários nos dias de hoje. A liderar o movimento encontra-se um pequeno grupo de realizadores, inseridos na mesma faixa etária, que já ganhou notoriedade para além das fronteiras do youtube e da blogoesfera. São eles: em primeiro lugar, Joe Swanberg (‘Hanna Takes the Stairs’; o explícito ‘Young American Bodies’ em que participou com a sua mulher; e 'Alexander the last', filme que será lançado esta semana); Andrew Bujalski (‘Mutual Appreciation’; ‘Funny Ha Ha’); Aaron Katz (‘Quiet City’ e ‘Dance Party USA’); e os irmãos Jay and Mark Duplass (‘The Puffy Chair’ e ‘Baghead’). Como seria de esperar a maior parte destes filmes pode ser encontrado na Internet para download (www.ifc.com) – na verdade, alguns dos realizadores pirateiam as suas próprias obras em sites.
Sobre o potencial destes filmes para deixar uma marca profunda no panorama cinematográfico, o artigo da New Yorker deixa um grande ponto de interrogação. Devo confessar que também eu fiquei um pouco confuso depois de ver os primeiros ‘trailers’ no Youtube, mas se calhar é preciso ver um filme inteiro para conseguir apreciar o género. Em última análise, parece-me que a ideia, talvez não complemente inesperada, consegue assimilar a realidade da vida contemporânea e nesse sentido merece a nossa curiosidade. Até porque a expressão 'cinema em casa' reveste-se cada vez mais de um novo significado.
quinta-feira, março 12, 2009
quarta-feira, março 11, 2009
A Conferência da Década

segunda-feira, março 09, 2009
O Efeito Wonder
O teste de forcas para o senhor Wonder foi logo na passada noite de quinta-feira, no jantar de desaceleração semanal com a minha madame. A música serviu de banda sonora a um caril de peixe (que quase ficou pelo caminho devido a uma falha da electricidade) e um vinho 'especial' que comprei para a ocasião. As canções lá foram tocando e devo confessar que, no começo, ambos ficamos um pouco desconfortáveis com a musicalidade lamechas, estilo balada 'à lá' anos oitenta, de temas como 'My Cherie Amour,' 'For Your Love' e 'I was made to love her'. Porém, à medida que a noite foi progredindo e a garrafa de vinho foi esvaziando, o som de Wonder ocupou a sala e cozinhou o ambiente para um belíssima noite a dois em casa.
Alentado pelo sucesso da minha selecção musical, decidi copiar as canções para o meu Ipod e trazer a música para a rua. Aqui, é importante explicar que, na caminhada diária até ao emprego, andar com os auscultadores nos ouvidos é o equivalente a estar dentro dos reluzentes BWMs e Minis que passam ao meu lado na rua, de vidros fechados, a ouvir música no máximo volume. Há dias em que a escolha musical pende para o Brasil, geralmente com o Seu Jorge ou a Elis Regina; outros em que se concentra no rock, a Icky Thump dos White Stripes são um most nos dias de chuva ou no final de um mau dia; e outros ainda que são para a palhaçada, em que o shuffle tanto pára no Pavarotti como nos Heróis do Mar. Mas, desde que comecei a ouvir o Senhor Maravilha, a minha viagem mudou.
O hino das 9.00 da manha é dado pelos sons combativos de 'Higher Ground'. Se passarem por mim a essa hora são capazes de encontrar um maluquinho de guarda-chuva em riste a cantar aos berros: 'People keep on learning, soldiers keep on warring, world keep on turning - cause it won't be too long.' Infelizmente, o efeito Wonder não se fica só pela cantoria, e lá para a terceira canção há fantasias de que, qual Shaft, acabo de sair das ruas perigosas do Porto para fazer justiça no Parlamento Europeu, e três shaftettes na minha cabeça sussurram o slogan: 'Diogo is his name. Diogo is his game.' Pior, aos primeiros acordes de 'Master Blaster', com a sua batida cálida de reagge, há mesmo um bater de perna, mesmo que esteja na passadeira à espera que caía o verde para peões, rodeado por outros transeuntes que também caminham para o emprego. Mas a música está tão forte que eu, indiferente a olhares um tanto ou quanto assustados, sigo pela rua num gingar desajeitado que rivaliza com o Ministry of Silly Walks de John Cleese e chego aos píncaros da alegria matinal com o compasso ritmado de 'Part-time Lover.'
A viagem está quase a acabar mas ainda há tempo para mais uma música, a última para ficar pronto e empacotado para mais um dia de trabalho e não há dúvidas que esse tempo de antena, esse derradeiro momento de good-feeling, pertence a uma só música: 'Signed, Sealed, Delivered, I'm Yours.' E assim lá vou eu, na subida para a porta do Parlamento, a quebrar a atmosfera sisuda de Bruxelas, dos que encaram a manha de segunda-feira com o pescoço curvado e os olhos no chão, com um sorriso enorme da cara e a festa do efeito Wonder a 'bombar' dentro a minha cabeça. Não tenho dúvidas que quem se cruze comigo me considere um tudo-nada deslocado da realidade, mas esse pequeno sacrifício da imagem é inteiramente justificado por um melhor início da semana. Enfim, acho que basta ler as duas primeiras estrofes de 'Master Blaster' para perceberem de que estou a falar:
'Everyone's feeling pretty
It's hotter than July
Though the world's full of problems
They couldn't touch us even if they tried
From the park I hear rhythms
Marley's hot on the box
Tonight there will be a party
On the corner at the end of the block
Didn't know you
Would be jammin' until the break of dawn
I bet nobody ever told you that you
would be jammin' until the break of dawn
You would be jammin' and jammin' and jammin', jam on''
Boa semana!
sábado, março 07, 2009
Passou-se ontem no Parlamento Europeu
Hillary Clinton deu ontem um enorme 'boost' ao Parlamento Europeu ao escolher fazer lá a sua primeira aparição na Europa como Secretária de Estado Norte-Americana. Foi numa sessão chamada 'The Next Generation' em que participaram 800 jovens de toda a Europa. Eu não estava nesta sala - apenas convidados - mas não andava longe. Este foi talvez o momento mais curioso de toda a conferência: a sessão de perguntas já tinha acabado, mas Hillary decidiu dar a palavra a um rapaz que dizia na t-shirt 'I love Hillary'. Eis senão quando reparo que uma compatriota nossa estava sentada ou lado dele - Joana diz-lhe que os Portugueses estão aqui!
sexta-feira, março 06, 2009
A Crise Californiana e a Revolucao Ecológica

A revelação, esta semana, de que a economia americana continuou a deteriorar-se nos meses de Janeiro e Fevereiro, lembrou-me imediatamente deste mapa com as taxas de desemprego nos EUA. O que mais me impressionou nele foi a evidência de que a crise nao afecta os EUA como um todo, mas sim alguns 'pockets', nomeadamente na costa ocidental, no sudoeste e à volta de Detroit, em Michigan. Na verdade, ao longo das últimas semanas tenho vindo a ler mais e mais notícias acerca das consequências da crise na California, a oitava maior economia mundial.

quinta-feira, março 05, 2009
terça-feira, março 03, 2009
Um Karma para o Século XXI

John Maeda estava ainda a fazer o doutoramento em Web Design no MIT quando se apercebeu que a procura pela simplicidade estava a mudar a nossa vida. Como o próprio explica no prefácio deste livro curioso, The Laws of Simplicity, a vantagem do Ipod em relacao a outros MP3 Players mais baratos e com mais funcoes era o seu mecanismo simples e acessivel a todos. Essa simplicidade está patente em muitas outras histórias de sucesso da nossa era como o Google e as sucessivas versoes do Windows. Desde modo, o autor decidiu estabelecer as 10 regras de simplicidade que devem nao só orientar investimentos nas novas tecnologias, mas também a nossa vida quotidiana. Aqui ficam essas 10 regras assim como o link para o seu blog: www.lawsofsimplicity.com:
1 - Reduce: The simplest way to achieve simplicity is through thoughtful reduction.
2 - Organize: Organisation makes a system of many appear few.
3 - Time: Savings in time feel like simplicity.
4 - Learn: Knowledge makes everything simpler.
5 - Differences: Simplicity and complexity need each other.
6 - Context: What lies in the periphery of simplicity is definitely not peripheral.
7 - Emotion: More emotions are less than none.
8 - Trust: In simplicity we trust.
9 - Failure: Some things can never be made simple.
10 - The One: Simplicity is about subtracting the obvious and adding the meaningful.