
O discutível Presidente do Irão, Mahmoud Ahmadinejad, começou ontem um périplo pela América Latina com paragens óbvias na Venezuela e na Bolívia e menos óbvias no Brasil. Antes de chegar, a presença do carrasco da paz mundial no país do samba já havia gerado consternação, dentro e fora de fronteiras. Sob o cabeçalho 'Vergonha de ser brasileiro’, Sérgio Malbergier, editor da secção Dinheiro da Folha de São Paulo e membro da numerosa comunidade judaica brasileira, escreveu: "O presidente brasileiro, genuinamente humanista, parece ter sido enrolado pelo terceiro-mundismo que domina os seus antecessores e o Itamaraty." Por sua vez, o Representante Democrata Eliot l. Engel comentou ao The New York Times que "esta visita é um erro enorme, um terrível erro. (...) Ele (Ahmadinejad) é ilegítimo perante o seu próprio povo, e agora o Brasil irá dar-lhe o ar de legitimidade numa altura em que mundo está à tentar evitar que obtenha armas nucleares. Não me faz sentido nenhum e, francamente, prejudica a imagem do Brasil." Na ocasião propriamente dita, o Presidente Lula defendeu o direito do Irão ao enriquecimento de urânio para ‘fins pacíficos’ e o Presidente Ahmadinejad expressou o desejo de ver o Brasil envolvido no processo de paz no Médio Oriente.
À primeira vista, a reunião parece fruto de um encontro simétrico de interesses. Lula dá legitimidade ao regime de Terão e Ahmadinejad “abençoa” a entrada do Brasil no pequeno palco das grandes decisões mundiais (aliás, o Presidente Iraniano apoiou também a inclusão do Brasil como permanente do Conselho de Segurança da ONU). Porém, nem tudo o que parece é; e no Médio Oriente, parecer é frequentemente mais relevante do que ser. Pois, parece que na fotografia está Ahmadinejad e Lula, mas, na verdade, está lá Ahmadinejad e Barack Obama. Perdoem-me o cepticismo, mas não creio que Lula da Silva, a quem Obama chamou ‘my favourite guy’, tomasse a iniciativa de receber o Presidente Iraniano sem aval de Washington. Por outro lado, Lula apresenta aos dois lados a oportunidade de prosseguir as negociações sem danificar a sua imagem interna: Barack Obama não necessita de ceder perante os caprichos de Ahmadinejad; e este mantém a linha dura diante ao Ocidente. Finalmente, Lula recebe o bónus de afirmar o Brasil no plano diplomático internacional sob um alto custo e maior risco. O custo é adquirir magnetismo às críticas. O risco é poder cair dentro do caldeirão do Médio Oriente. Mas o esforço e a coragem são sempre meritórios. Na minha plebeia opinião.