
No sábado passado, o
Expresso publicou um interessante e oportuno artigo do seu correspondente no Médio Oriente, Henrique Cymerman, sobre o sucesso de Israel na área das altas tecnologias. Numa altura em que o 'choque tecnológico' de José Sócrates se encaminha para um final insosso, e os portugueses perguntam o que poderá ser feito para sacudir, de uma vez por todas, a pobreza e atraso do país, vale a pena ler sobre este país, que é muito menor do que nosso, embrenhado em problemas existenciais incomensurávelmente mais graves do que os nossos e que, ao longo das suas seis décadas de existência, teve de lutar contra dificeis condições geográficas (falta de água, aridez dos solos, etc), sociais (sucessivas vagas de imigração) e políticas (instabilidade, radicalização de posições ideológicas, intervenções externas, etc) e que, apesar de tudo isto, está hoje na vanguarda de um dos sectores mais dinâmicos da economia munidal. É claro, não podemos deixar de notar que Cymerman 'se esquece' de referir que o milagre económico israelita beneficia do apoio e da relação estreita com altas patentes das comunidades ciêntíficas e económicas nos Estados Unidos da América, muitas das quais vêem a colocação de delegrações, institutos e laboratórios em Israel como uma forma de contribuição para o projecto sionista. Porém, a verdade é que muitos outros países também beneficiaram desse sustento e não foram capazes de retirar dele os proveitos que Israel consegue e conseguirá - portanto, há aqui uma (ou várias) lições a aprender e que dizem respeito não só a um povo, nem aos fiéis de determinada religião, mas sim a modelos de desenvolvimento universais. E assim, passo a palavra ao Senhor Cymerman:
"O Presidente de Israel, Shimon Peres, costuma dizer que o maior contributo hebreu para o mundo é a insatisfação. Há uma palavra hebraica – hutspa – que descreve este espírito: algo entre o atrevimento e a insolência.
‘Um judeu nunca pode estar insatisfeito.’ Peres troça daqueles que, em Israel lamentam que Moisés não tenha conduzido as tribos para uma zona com petróleo. ‘O petróleo corrompe e contamina.’ A falta de recursos naturais é um dos factores-chave do desenvolvimento da alta tecnologia em Israel, um país com apenas 61 anos e um quinta da área de Portugal.
Os investigadores norte-americanos Dan Senor e Saul Singer publicaram recentemente um livro,
‘Start-Up Nation’, em que sublinham que apesar das guerras, ou talvez por causa delas, o high tech israelita continua florescente. Um país em guerra semipermanente – com menos população que o estado de Nova Jérsia – tem mais empresas de alta tecnologia inscritas no Nasdaq do que a Europa, Japão, Coreia do Sul, Índia e China.
Em 2008 os investimentos estrangeiros em capital de risco em Israel foram 2,5 maiores que os dos EUA, 30 vezes os da Europa e 80 vezes os da China. Num ano de crise mundial, estes investimentos representaram 2000 milhões de dólares (€1399 milhões), mais do que na Grã-Bretanha ou do que na França e Alemanha juntas. Segundo Senor e Singer, isso deve-se ao facto de grandes empresas como a Google, Intel, Motorola, Ebay ou Cisco considerarem as suas representações em Israel como os laboratórios mais avançados, ‘onde se resolvem os problemas tecnológicos considerados sem solução no estado-maior das empresas.’
O director da empresa israelita de alta tecnologia Radcom, Adar Eyal, acredita que isto tem muito que ver com a falta de hierarquia reinante na sociedade israelita. ‘Quando levo estrangeiros a bases militares, ficam atónitos ao ver soldados e generais tratando-se por tu e servindo-se café, sem distinção de patentes. Em muitos aspectos continuamos a ser uma espécie de kibbutz, para o bom e para o mau, e isso também se nota nas start-ups.”
(…)
“O visitante norte-americano reconheceu que um jovem de 25 anos em Israel é ‘muito mais maduro e experiente’ que noutros lugares do mundo, já que cumpriu um serviço militar de pelo menos três anos, durante o qual teve de tomar decisões difíceis e dominar temas muito avançados de informática.
A impaciência israelita, salpicada, por vezes, por rudeza e a eternização do conflito com os palestinianos, podem ameaçar o milagre económico israelita. Cada vez que se vive alguma segurança, a economia floresce. Os investigadores dos EUA resumem: ‘Israel não é só um país, é também um estado de espírito. É a vitória do hutspa.’”