Para a sua primeira crónica do ano de 2010, o super-influente colunista do New York Times, David Brooks, escolheu discutir o tema da década que se segue (recomendo vivamente a leitura integral do texto). Segundo ele, os ‘tenies’ serão marcados por um movimento que nasceu em reacção à eleição de Barack Obama para a Casa Branca: o Tea Party Movement.
Como o próprio nome indica, o movimento reclama para as suas origens nada mais, nada menos do que o protesto que marcou o início da cruzada norte-americana pela independência: o Boston Tea Party. No entanto, em comum com os eventos de 1773, o Tea Party Movement contemporâneo tem apenas a essência, não a substância. Ou seja, os Tea Party-goers moderno não se revoltam contra o preço do chá nos supermercados ou nas lojas, mas sim contra a suposta subida dos impostos da administração Obama. Desse modo, o anteriormente objectivo conceito ‘Tea’, transformou-se hoje no slogan T-E-A: ‘Taxed Enough Already’. Para além dos impostos, nas Tea Parties manifesta-se contra o aumento do aparelho de Estado, nomeadamente a reforma do sistema de saúde proposta por Obama; o pacote de estímulo conta a recessão; a político colaboracionista no plano internacional; e o deficit do Governo central norte-americano. As Tea Parties, organizadas através de sites (o mais conhecido Tea Party Express), blogs, contas de Twitter, e grupos no Facebook, ocorrem simultaneamente em várias cidades dos EUA. A mais popular teve lugar no dia 15 de Abril de 2009, planeada para coincidir com o último dia para a entrega das declarações de impostos, e contou com protestos em mais de 750 cidades, e uma alegada adesão de meio milhão de americanos (de acordo com os dados referidos pelo Christian Science Monitor). No dia seguinte, uma sondagem da agência Rasmussen revelou que 51% do povo americano considerava os protestantes ‘favoravelmente.’ E estes valores, note-se, no primeiro ano de actividade do movimento.
Afinal, quem são os participantes destas Tea Parties? Como refere Brooks, as Tea Parties atraem os americanos que abominam qualquer ideia associada com as ‘classes educadas’: o aquecimento global; uma postura internacionalista; o direito ao aborto; a necessidade de controlar a venda de armas; e outras causas afins. No fundo, estamos de volta ao terreno da velha divisão entre o norte e o sul, entre as costas e o centro, entre o redbelt e o bluebelt norte-americano, entre os que se sentiam acalentados por ver as botas texas de Bush sobre a secretária da sala Oval e os que se sentiam repugnados pelas constantes baboseiras proferidas pelo antigo Presidente dos EUA.
O tema foi claramente exposto por um artigo recente da revista New Yorker, em que se escrevia que Sarah Palin era a mais apta candidata do Partido Republicano contra Barack Obama por ser a sua mais perfeita nemesis: uma estrela Republicana contra uma estrela Democrática. No entanto, referia a revista, acrescia a esta simetria o facto do star appeal de Palin assentar na simplicidade da sua postura sobre a vida e a história, à sua aparente falta de ‘worldliness’ contra a erudição e o cosmopolitismo de Obama, antigo aluno da escola mais elitista dos EUA, a Harvard University, e professor na distinta Universidade de Chicago. Perguntava a New Yorker: ‘será talvez uma forma de socialismo desejar que um de nós, simples e ignorante cidadão, ocupe os mais altos cargos do Estado?’ Pois é, para choque e desconsolo de muitos Europeus, existe uma grande parte do povo americano (metade, quase poderíamos afirmar) que espera que os seus líderes sejam, ou pelo menos aparentem ser, tão estúpidos e ignorantes como eles.
Porém, e numa nota final, a ascensão do Tea Party Movement representa um desafio não só para o Partido Democrático, mas também para o Partido Republicano. A verdade é que o próprio partido está dividido entre aqueles que desejam seguir esta via mais radical, e aqueles que pretendiam manter-se num registo mais ponderado – o próprio Brooks, assumidamente Republicano, declara-se preocupado com o movimento. Por todos estes motivos, começam a surgir rumores do aparecimento de uma terceira força política nos EUA. Onde será que já vi este filme?
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