Quem seguiu as notícias nos últimos dias terá certamente notado o alarido sobre a reforma de uma correspondente da Casa Branca de 89 anos, chamada Helen Thomas. Expectável? Para os que conhecem a carreira desta intrépida jornalista que, desde os tempos de JF Kennedy, detinha lugar cativo na primeira fila das conferências de imprensa na Casa Branca a notícia é pelo menos desconcertante. Helen Thomas estava tão perto do Olimpo quanto será alguma vez permitido a um vulgar jornalista estar (mais informação e fotografias sobre o percurso de Helen Thomas no site do The New York Times). O seu afastamento foi especialmente perturbador pelas condições em que teve lugar.
Helen Thomas foi traída por um meio que não sendo da sua época, ela fez seu contemporâneo: o vídeo instantâneo. Há algumas semanas atrás, o rabbi David Nesenoff de Long Island e o seu filho visitaram a Casa Branca por motivo de um evento de comemoração da história Judia. Nos jardins do local, deparam-se de súbito com a legendária correspondente e o rabbi decidiu colocar-lhe uma pergunta para a câmara: que conselho daria aos Israelitas? A resposta de Thomas, que poderão observar acima, foi prolificamente difundida na internet, gerando uma onda de condenação que acabaria por forçar o seu afastamento. E, assim, acabaria a carreira da mulher que desafiou todos os estereótipos do meio em que se movia e que até Fidel Castro fez tremer.
As declarações de Helen Thomas são, de facto, reprováveis. Vários colegas da senhora acorreram a lembrar que os seus pais eram Libaneses e que, no fundo, Helen nunca conseguiu ultrapassar o ressentimento familiar contra os Israelitas. Mais concretamente, insinuar que a Palestina não é ‘a casa’ dos Israelitas é uma declaração incendiária e até insultuosa que ignora os muitos judeus que sempre viveram na região. Para além do mais, Thomas negligência também o facto de os judeus terem sido forçados, através de actos brutais e inenarráveis, a abandonar as supostas ‘casas’ na Alemanha e na Polónia. De novo, este tipo de retórica não contribui para que ambos os lados, Israelitas e Palestinianos, possam confiar nas intenções um do outro e para que assim possam chegar a um consenso sobre a terra que ambos ocupam.
Por outro lado, a reacção que o vídeo provocou assim como a consequência que causou - a reforma de Helen Thomas - parecem desproporcionais à gravidade do delito. Todos os dias, jornalistas, comentadores e políticos americanos proferem afrontas à dignidade e condição do povo árabe. Chama-lhes ‘atrasados’, ‘sanguinários’, ‘desonestos’, amalgamam-nos numa só categoria, confundindo-os uns com os outros, desejam o seu declínio e conspiram publicamente para alcançar esse fim. Porém, nenhum deste é forçado a pedir a demissão ou a reforma. Esse ponto de vista, infelizmente, é aceite na América dos dias de hoje. Mais a mais, Helen Thomas não ocupa nenhum cargo de Estado e não frustrou as expectativas que um grupo de eleitores depositou nela. Helen Thomas é uma jornalista, aliás comentadora era o seu título oficial, que foi interpelada na rua para dar uma opinião pessoal sobre um tema. Proferi-la não representa nenhum crime. Pelo contrário, forçar a sua reforma como consequência da sua opinião, representa um grave atentado à liberdade de expressão.
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